segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Sistema fisiológico de supressão da dor

         O portão regula o influxo de impulsos nociceptivos, mesmo antes de se criar uma percepção à dor. A variação na passagem dos potenciais de ação (nociceptivas) que o portão produz é determinada pela atividade das fibras grossas (A-alfa e A-beta) e finas (A-delta e C), e também por influências cognitivas.
        Quando há lesão tecidual, os estímulos nociceptivos são transmitidos por fibras finas, que penetram nos cornos posteriores da medula, ativando células de transmissão presentes na substância Gelatinosa (SG). A atividade das fibras grossas excita interneurônios que libera encefalina na conexão pré-sinática com célula T, inibindo a liberação de substância P, ou seja, inibindo a transmissão para as células dos influxos procedentes das fibras finas (da dor), ao mesmo tempo que se projeta ascendentemente no tronco encefálico para as estimulações táteis.
         As fibras finas necessitam de fortes "estímulos" para transmitir os impulsos até as células T. Nas células T convergem fibras vindas de todo corpo (fibras da pele, das vísceras e de outras estruturas) que com suas influências, facilitador e inibidor, determinam um fluxo resultante maior ou menor conforme a modulação do portão da dor.
         Quando esta resultante ultrapassar um limiar, as zonas neurais responsáveis pela experiência dolorosa e sua reação, são ativadas. As fibras grossas funcionam como mecanismo de inibição da dor. Elas provocam uma descarga intensa nas células da lâmina V (responsáveis pela percepção da dor) onde se segue um período de inibição.
            Um sistema especializado de fibras A de condução rápida (fibras c/ bainha de mielina) ativa processos seletivos cognitivos, que influenciam as propriedades moduladoras ao mecanismo do controle espinhal, por meio das fibras descendentes.
           Sabemos que neurotransmissores atuam nas terminações das fibras finas, diminuindo a liberação da substância P o que caracteriza uma inibição do tipo pré-sináptica. Talvez isso explique a razão para o reflexo de massagear um local contundido, uma vez que a massagem estimula as fibras grossas do tato, excitando as células do CPME, produzindo encefalina e inibindo a transmissão da dor.
          A morfina é o principal neutransmissor de inibidor da dor no cérebro. A demonstração da existência de receptores de morfina em várias regiões do sistema nervoso supramedular e a constatação de que a injeção de morfina na substância periaquedutal messencefálica provoca anestesia prolongada devido à ativação de tratos descendentes inibitórios, foram marcos importantes para consolidar os conceitos modernos sobre os mecanismos de supressão da dor.
           Foram identificados peptídeos com função morfínica em várias regiões do SNC, nas fibras dos núcleos magno e dorsal da rafe, na substância cinzenta periaquedutal, no tálamo e na amígdala, além de nas células do CPME. Em células da porção anterior e intermediária da hipófise, no núcleo arqueado do hipotálamo, no núcleo do trato solitário e em fibras que, do núcleo arqueado se projetam no septo, tálamo, mesencéfalo e substância periaquedutal do mesencéfalo, na substância negra, estruturas do sistema límbico. Estas substâncias neurotransmissoras ligará-se a subtipos de receptores de morfina envolvidos no mecanismo de supressão da dor.
         Parece que as vias noradrenérgicas, colinérgicas e dopaminérgicas também participam da analgesia induzida pelo GABA. A neurotensina, que se encontra presente na substância cinzenta periaquedutal mesencefálica, atua nas vias descendentes supressoras do núcleo da rafe.
        GABA exerce atividade sobre os neurônios do internúncio presentes no CPME. Parece que a calcitonina tem uma atividade excitatórias sobre o CPME, e, a substância P, atividade excitatória e inibitória.
          Com frequência, os indivíduos não percebem imediatamente a dor causada por traumatismos, como no caso de atletas no caso de uma competição em que estejam envolvidos. Enquanto que, em outras situações, o estímulo nociceptivo é percebido com intensidade exagerada. Estes mecanismos de controle da nocicepção parecem atuar rapidamente, mesmo antes que haja percepção de um estímulo nociceptivo.
         Em caso de dor crônica surgem alterações da fisiologia de vários órgãos e sistemas do indivíduo, como por exemplo, a ativação simpática que envolve constante estado de alerta do organismo. Sendo o sistema analgésico intrínseco parte de um mecanismo regulador complexo, ativado pela estimulação discriminativa, nociceptiva ou não, atenua a dor.
           Em caso de dor crônica, o aumento da serotonina vai produzir um círculo vicioso da dor, provocando alterações no ciclo sono-vigília, comumente na forma de insônia. Essas alterações, por sua vez, vão aumentar ainda mais a produção de serotonina que, enquanto substância algiogênica, contribuirá para o incremento dos níveis de dor sentida.
           O estímulo nocivo é um dos mais susceptíveis para a produção da analgesia, talvez por atuar de modo expressivo sobre o sistema supressor descendente. Tanto nos seres humanos como animais esse mecanismo atua apenas na supressão da dor em queimação, sugerindo que a duração da dor e o estresse são importantes para a ativação de sistemas moduladores através de fatores ambientais complexos de atenção, e de condicionamento.
          Disto se pode concluir que as unidades neuronais, dos canais sensoriais e os neurotransmissores envolvidos no mecanismo de supressão e a ativação das vias nociceptivas, parecem atuar conjugadamente. Assim, a ativação dos receptores de morfina no tronco, a estimulação do tálamo e da substância cinzenta periaquedutal mesencefálica, entre outras estruturas, podem bloquear os reflexos nociceptivos espinhais, através da excitação das vias bulbo-espinhais inibitórias. A substância P parece liberar encefalinas nas terminações do CPME. A supressão do mecanismo de modulação resulta em aumento aparente da intensidade do estímulo, tal como ocorre em situações de bloqueio da ação do GABA, ou após a administração de bicuculina.
           A dor da lesão de nervos periféricos talvez pode ser explicada, através da teoria do portão, pela somação excessiva das fibras que convergem para as células T; e pela degenerescência das fibras nervosas. E a explicação, também de acordo com a teoria do portão, para a persistência dessa dor durante vários anos depois da agressão, talvez esteja relacionada ao fato de que a perda de todo tipo de fibra abre a portar à dor patológica. Quando não há queixa de dor após a lesão de nervos periféricos, sugere-se que o organismo solicitaria uma espécie de mecanismo de compensação : fibras descendentes inibitórias seriam ativadas para conservarem abaixo do nível crítico necessário para surgir dor em caso de descargas excessivas das células T.
        A teoria do portão oferece explicação para a dor espontânea e somação temporo-espacial. Uma maneira para explicar a dor espontânea seria o fato de que a convergência dos impulsos nervosos nas células T contribuiria para o débito total, e na falta de um inibidor que opere depois da descarga inicial das células. T, estímulos sucessivos produziriam cada vez mais e intensamente impulsos dolorosos.
        Outra forma de explicar é através da lógica entre a perda das fibras periféricas e o tempo de percepção e reação. Com o número reduzido de fibras periféricas, as células T podem demandar mais tempo para atingir o nível de descarga necessária para desencadear dor. Por isso a percepção da dor e sua conseqüente reação aparecerem depois da lesão.
        Estes métodos que utilizam da teoria do portão para controle da dor evidenciam que existe vários fatores desde a lesão à percepção e reação à dor. Processos psicológicos podem ter um influência sobre a percepção da dor e a reação consecutiva, atuando no mecanismo espinhal do portão. Algumas atividades psicológicas podem fechar ou abrir o portão. Além dos processos psicológicos, fatores genéticos também podem explicar porque pessoas sentem mais ou menos dor.
        A teoria do portão tem mostrado que muitas técnicas antigas para diminuir a dor não são só superstições, têm fundamentos fisiológicos e psicológicos. Ela se aplica aos casos de cognição, tal qual o tratamento pré-natal e assistência psicológica à doentes. Ao reduzir a ansiedade ou angústia dos pacientes, é possível que ele distraia sua atenção e pare de concentrar-se na dor ou lesão.
        É preciso conhecer nosso mecanismo corporal, orgânico e psíquico, para podermos usufruir de todas as facilidades do nosso corpo e ambiente, e vivermos cada dia melhor.



SOUZA, F.P de. A aplicação da teoria do portal. Revista de psicofisiologia, [s.l], v.1, n.2, 1997. Disponível em: www.icb.ufmg.br/lpf/revista/...dor(I)/cap3.htm> Acesso em: 25 nov. 2010.

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