segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Cefaleias


     
           Existem numerosas cefaleias, que diferem quanto à localização, pelas características próprias da dor, pelas condições em que se apresentam os sintomas associados e pela forma de evolução. As cefaleias podem ser primárias (quando a cefaleia é a patologia, ou seja, a própria doença) ou secundárias, quando a cefaleia é consequência de um traumatismo craniano, um tumor, infecções...
         A cefaleia pode ser classificada como intracraniana ou extracraniana consoante a área onde inicialmente se instala. A dor intracraniana geralmente acompanha-se de distúrbios da visão, tonturas, dificuldades de audição, alterações na personalidade e problemas relacionados com a memória.
        Estes casos, embora menos comuns, requerem cuidados médicos imediatos, porque podem estar associados a causas graves, como um tumor, abcesso, hematoma ou infecção. A dor extracraniana é mais frequente e tem uma etiologia diversa. As principais cefaleias primárias são: enxaqueca, cefaleia de tensão e cefaleia em salvas.As principais cefaleias secundárias são as cefaleias variadas não associadas a lesões estruturais. Vamos referir as mais frequentes.

CEFALEIAS TIPO TENSÃO
       As cefaleias tipo tensão são provocadas por um estado de stress, de ansiedade ou por um estado depressivo.dor é geralmente mal definida, tipo aperto, pressão ou peso, bilateral, localizada geralmente na base do crânio, leve a moderada, não agravada pelo esforço físico. Todavia, estas cefaleias são de díficil diagnóstico devido à variabilidade de indivíduo para indivíduo. Trata-se de uma cefaleia primária mais frequente que a enxaqueca.

CEFALEIAS EM SALVAS
       Não se conhece claramente a causa. Localiza-se num lado da cabeça, nas regiões orbitária, supra-orbitária e/ou temporal. Apresenta-se como uma crise de dor intensa, acompanhada de lacrimação, secreção nasal, eritema (avermelhamento) e transpiração da metade da cara. Surge sobretudo no sexo masculino.

CEFALEIAS NÃO ASSOCIADAS A LESÕES ESTRUTURAIS
       Uma infecção, quer se trate de uma simples constipação ou de uma forte gripe, desencadeia dores de cabeça acompanhadas de febre mais ou menos elevada e, por vezes, de insónias, vertigens ou corrimentos nasais. Uma afecção a nível dos dentes, orelhas, olhos e sobretudo dos seios nasais provoca uma cefaleia caracterizada por uma dor local intensa, que varia em função da posição da cabeça. A dor de cabeça provocada pela sinusite tem uma localização exclusivamente frontal e em redor dos olhos. Os sintomas que a acompanham são o corrimento nasal (rinorreia), a congestão nasal e a sensação de pressão nos seios nasais.
        Mas a dor em redor dos olhos (dor retro-orbital) pode ser devida a problemas de visão, como a dificuldade de focagem dos objectos ao perto ou ao longe. Se persistir, aconselha-se uma consulta de oftalmologia. De igual modo, a dor persistente na face ou mandíbulas pode estar relacionada com problemas dentários ou ópticos. Uma hipertensão arterial também pode originar cefaleias. Surgem de modo quotidiano e quase sempre de manhã. A dor localiza-se ao nível da nuca e à volta do crânio, acompanha-se geralmente de fadiga, perturbações visuais e hemorragias nasais.

CEFALEIAS ASSOCIADAS A LESÕES ESTRUTURAIS
       Determinadas intoxicações provocam igualmente cefaleias: o monóxido de carbono proveniente de um aparelho de aquecimento defeituoso, o fumo, bem como o álcool etílico, após ingestão de um excesso de bebidas alcoólicas. As cefaleias de origem cervical são caracterizadas por uma dor súbita, unilateral, após um movimento excessivo da cabeça. A principal causa da cervicalgia é a artrose, mas as lesões da zona intermédia entre as vértebras e o crânio também podem originar dores de cabeça. Nas cefaleias de origem vascular, a dor é breve e pulsátil. A má circulação sanguínea provoca um eritema facial (contrariamente, enxaqueca o rosto torna-se pálido).



GUERREIRO, S. Cefaléias. [s.l], 01 ago.2007. Disponível em:< http://soniaguerreiro.blogs.sapo.pt/74538.html>. Acesso em: 25 nov. 2010

Dor visceral

       
          É mediada por fibras aferentes do sistema nervoso autônomo, cujos receptores se localizam na parede das vísceras ocas e na cápsula dos órgãos parenquimatosos. É desencadeada sempre que se aumenta a tensão da parede da víscera, seja por distensão, inflamação, isquemia ou contração exagerada da musculatura. A dor visceral é uma sensação dolorosa profunda, surda e mal localizada, de início gradual e de longa duração. É sentida na linha mediana do abdome devido à inervação sensorial ser bilateral; fazem exceção as vísceras duplas como rins e ureteres, anexos uterinos onde a dor tende a ser do lado afetado, pois nestas as vias nervosas são unilaterais. A sensação de dor é projetada em diferentes níveis de parede abdominal, desde o epigástrio até o hipogástrio, na dependência da origem embriológica da víscera afetada (intestino primitivo superior no epigástrio, médio no mesogástrio ou inferior no hipogástrio). A dor visceral pode se associar a hiperestesia cutânea e a hiperestesia muscular. A esse tipo de dor denomina-se dor referida, por ser percebida em local (habitualmente cutâneo) distante do inicial e suprida pelo neurossegmento da víscera doente. Isso se deve à percepção central distorcida da dor, devido à propagação do estímulo doloroso das fibras aferentes do sistema nervoso autônomo para fibras dos nervos somáticos do metâmero correspondente no corno posterior da medula espinhal. De regra, esse tipo de dor surge quando o estímulo doloroso visceral se torna mais intenso.
        A dor visceral é sempre a primeira manifestação de doença intra-abdominal sendo, com freqüência, resultante de alterações da motilidade de vísceras ocas (cólica intestinal, uretral, biliar), em especial quando secundária a gastroenterocolites agudas; apenas quando a dor visceral se soma à dor somática (parietal) é que se suspeita de abdome agudo.




Dor visceral, parietal, referida e irradiação da dor. [s.l], 03 dez. 2000. Disponível em: < http://estudmed.com.sapo.pt/trabalhos/sindromes_abdominais_agudas_2.htm.> Acesso em: 25 nov. 2010

Dor referida


           Pode ocorrer por estímulo direto de fibras nervosas somáticas que se originam em níveis superiores da medula espinhal. É o que ocorre por exemplo no diafragma, que tem dupla inervação somática devido à sua origem embriológica. Quando seu centro tendíneo é estimulado por ar, sangue, suco gástrico ou pus, a dor se localizará na região cervical cuja inervação é feita pelos nervos cervicais originários das mesmas raízes nervosas que o nervo frênico (C3, C4, C5); quando os estímulos atingem sua porção mais periférica a irradiação se fará na parede abdominal, no território dependente dos nervos intercostais.

Sistema fisiológico de supressão da dor

         O portão regula o influxo de impulsos nociceptivos, mesmo antes de se criar uma percepção à dor. A variação na passagem dos potenciais de ação (nociceptivas) que o portão produz é determinada pela atividade das fibras grossas (A-alfa e A-beta) e finas (A-delta e C), e também por influências cognitivas.
        Quando há lesão tecidual, os estímulos nociceptivos são transmitidos por fibras finas, que penetram nos cornos posteriores da medula, ativando células de transmissão presentes na substância Gelatinosa (SG). A atividade das fibras grossas excita interneurônios que libera encefalina na conexão pré-sinática com célula T, inibindo a liberação de substância P, ou seja, inibindo a transmissão para as células dos influxos procedentes das fibras finas (da dor), ao mesmo tempo que se projeta ascendentemente no tronco encefálico para as estimulações táteis.
         As fibras finas necessitam de fortes "estímulos" para transmitir os impulsos até as células T. Nas células T convergem fibras vindas de todo corpo (fibras da pele, das vísceras e de outras estruturas) que com suas influências, facilitador e inibidor, determinam um fluxo resultante maior ou menor conforme a modulação do portão da dor.
         Quando esta resultante ultrapassar um limiar, as zonas neurais responsáveis pela experiência dolorosa e sua reação, são ativadas. As fibras grossas funcionam como mecanismo de inibição da dor. Elas provocam uma descarga intensa nas células da lâmina V (responsáveis pela percepção da dor) onde se segue um período de inibição.
            Um sistema especializado de fibras A de condução rápida (fibras c/ bainha de mielina) ativa processos seletivos cognitivos, que influenciam as propriedades moduladoras ao mecanismo do controle espinhal, por meio das fibras descendentes.
           Sabemos que neurotransmissores atuam nas terminações das fibras finas, diminuindo a liberação da substância P o que caracteriza uma inibição do tipo pré-sináptica. Talvez isso explique a razão para o reflexo de massagear um local contundido, uma vez que a massagem estimula as fibras grossas do tato, excitando as células do CPME, produzindo encefalina e inibindo a transmissão da dor.
          A morfina é o principal neutransmissor de inibidor da dor no cérebro. A demonstração da existência de receptores de morfina em várias regiões do sistema nervoso supramedular e a constatação de que a injeção de morfina na substância periaquedutal messencefálica provoca anestesia prolongada devido à ativação de tratos descendentes inibitórios, foram marcos importantes para consolidar os conceitos modernos sobre os mecanismos de supressão da dor.
           Foram identificados peptídeos com função morfínica em várias regiões do SNC, nas fibras dos núcleos magno e dorsal da rafe, na substância cinzenta periaquedutal, no tálamo e na amígdala, além de nas células do CPME. Em células da porção anterior e intermediária da hipófise, no núcleo arqueado do hipotálamo, no núcleo do trato solitário e em fibras que, do núcleo arqueado se projetam no septo, tálamo, mesencéfalo e substância periaquedutal do mesencéfalo, na substância negra, estruturas do sistema límbico. Estas substâncias neurotransmissoras ligará-se a subtipos de receptores de morfina envolvidos no mecanismo de supressão da dor.
         Parece que as vias noradrenérgicas, colinérgicas e dopaminérgicas também participam da analgesia induzida pelo GABA. A neurotensina, que se encontra presente na substância cinzenta periaquedutal mesencefálica, atua nas vias descendentes supressoras do núcleo da rafe.
        GABA exerce atividade sobre os neurônios do internúncio presentes no CPME. Parece que a calcitonina tem uma atividade excitatórias sobre o CPME, e, a substância P, atividade excitatória e inibitória.
          Com frequência, os indivíduos não percebem imediatamente a dor causada por traumatismos, como no caso de atletas no caso de uma competição em que estejam envolvidos. Enquanto que, em outras situações, o estímulo nociceptivo é percebido com intensidade exagerada. Estes mecanismos de controle da nocicepção parecem atuar rapidamente, mesmo antes que haja percepção de um estímulo nociceptivo.
         Em caso de dor crônica surgem alterações da fisiologia de vários órgãos e sistemas do indivíduo, como por exemplo, a ativação simpática que envolve constante estado de alerta do organismo. Sendo o sistema analgésico intrínseco parte de um mecanismo regulador complexo, ativado pela estimulação discriminativa, nociceptiva ou não, atenua a dor.
           Em caso de dor crônica, o aumento da serotonina vai produzir um círculo vicioso da dor, provocando alterações no ciclo sono-vigília, comumente na forma de insônia. Essas alterações, por sua vez, vão aumentar ainda mais a produção de serotonina que, enquanto substância algiogênica, contribuirá para o incremento dos níveis de dor sentida.
           O estímulo nocivo é um dos mais susceptíveis para a produção da analgesia, talvez por atuar de modo expressivo sobre o sistema supressor descendente. Tanto nos seres humanos como animais esse mecanismo atua apenas na supressão da dor em queimação, sugerindo que a duração da dor e o estresse são importantes para a ativação de sistemas moduladores através de fatores ambientais complexos de atenção, e de condicionamento.
          Disto se pode concluir que as unidades neuronais, dos canais sensoriais e os neurotransmissores envolvidos no mecanismo de supressão e a ativação das vias nociceptivas, parecem atuar conjugadamente. Assim, a ativação dos receptores de morfina no tronco, a estimulação do tálamo e da substância cinzenta periaquedutal mesencefálica, entre outras estruturas, podem bloquear os reflexos nociceptivos espinhais, através da excitação das vias bulbo-espinhais inibitórias. A substância P parece liberar encefalinas nas terminações do CPME. A supressão do mecanismo de modulação resulta em aumento aparente da intensidade do estímulo, tal como ocorre em situações de bloqueio da ação do GABA, ou após a administração de bicuculina.
           A dor da lesão de nervos periféricos talvez pode ser explicada, através da teoria do portão, pela somação excessiva das fibras que convergem para as células T; e pela degenerescência das fibras nervosas. E a explicação, também de acordo com a teoria do portão, para a persistência dessa dor durante vários anos depois da agressão, talvez esteja relacionada ao fato de que a perda de todo tipo de fibra abre a portar à dor patológica. Quando não há queixa de dor após a lesão de nervos periféricos, sugere-se que o organismo solicitaria uma espécie de mecanismo de compensação : fibras descendentes inibitórias seriam ativadas para conservarem abaixo do nível crítico necessário para surgir dor em caso de descargas excessivas das células T.
        A teoria do portão oferece explicação para a dor espontânea e somação temporo-espacial. Uma maneira para explicar a dor espontânea seria o fato de que a convergência dos impulsos nervosos nas células T contribuiria para o débito total, e na falta de um inibidor que opere depois da descarga inicial das células. T, estímulos sucessivos produziriam cada vez mais e intensamente impulsos dolorosos.
        Outra forma de explicar é através da lógica entre a perda das fibras periféricas e o tempo de percepção e reação. Com o número reduzido de fibras periféricas, as células T podem demandar mais tempo para atingir o nível de descarga necessária para desencadear dor. Por isso a percepção da dor e sua conseqüente reação aparecerem depois da lesão.
        Estes métodos que utilizam da teoria do portão para controle da dor evidenciam que existe vários fatores desde a lesão à percepção e reação à dor. Processos psicológicos podem ter um influência sobre a percepção da dor e a reação consecutiva, atuando no mecanismo espinhal do portão. Algumas atividades psicológicas podem fechar ou abrir o portão. Além dos processos psicológicos, fatores genéticos também podem explicar porque pessoas sentem mais ou menos dor.
        A teoria do portão tem mostrado que muitas técnicas antigas para diminuir a dor não são só superstições, têm fundamentos fisiológicos e psicológicos. Ela se aplica aos casos de cognição, tal qual o tratamento pré-natal e assistência psicológica à doentes. Ao reduzir a ansiedade ou angústia dos pacientes, é possível que ele distraia sua atenção e pare de concentrar-se na dor ou lesão.
        É preciso conhecer nosso mecanismo corporal, orgânico e psíquico, para podermos usufruir de todas as facilidades do nosso corpo e ambiente, e vivermos cada dia melhor.



SOUZA, F.P de. A aplicação da teoria do portal. Revista de psicofisiologia, [s.l], v.1, n.2, 1997. Disponível em: www.icb.ufmg.br/lpf/revista/...dor(I)/cap3.htm> Acesso em: 25 nov. 2010.

Transmissão do impulso da dor

Transmissão da dor para o sistema nervoso central

              Os aferentes nociceptivos primários, representados pelas fibras A-d e C, são fibras sensoriais de elevado limiar, projetadas da periferia para o corno dorsal da medula onde ativam grande número de neurônios internunciais de segunda ordem e neurônios de projeção da medula, alguns dos quais são ativados exclusivamente por estímulos nóxicos (nociceptivos específicos) e outros por estímulos de baixa intensidade (neurônios de larga faixa dinâmica ou multirreceptivos). As fibras C não-mielinizadas terminam nas lâminas I, II e V do corno dorsal, enquanto as fibras mielinizadas A-d terminam na lâminas I e II e também penetram mais profundamente nas lâminas V e X (Figura 1)1.
             Sabe-se atualmente que a medula, que tradicionalmente foi considerada como simples estação intermediária para os impulsos sensoriais, é formada por complexa estrutura contendo grande variedade neuronal e arranjos sinápticos, bem como considerável número de neurotransmissores e neuropeptídios. A medula permite não somente a recepção e transmissão dos impulsos sensoriais como também um elevado grau de modulação central, envolvendo abstração local, integração, seleção e dispersão apropriada dos impulsos sensoriais. Esta complexa forma de processamento medular é ativada através de fenômenos centrais de convergência e somação, bem como através de influências excitatórias e inibitórias, envolvendo neuronais periféricas, interneurônios locais, vias neuronais do tronco encefálico e supraespinhais e córtex cerebral. Após sofrer as influências de modulação do corno dorsal alguns impulsos nociceptivos passam diretamente ou através de interneurônios para as células do corno anterior e anterolateral onde estimulam neurônios somatomotores e pré-ganglionares simpáticos, provocando resposta nociceptiva segmentar autonômica reflexa. Outros impulsos nociceptivos são transmitidos para neurônios que fazem sinapse com neurônios do trato espinotalâmico e outros sistemas ascendentes que então convergem para o tronco encefálico e estruturas supraespinhais onde promovem respostas reflexas suprasegmentares e corticais.
          Diversos neurotransmissores, aminoácidos e neuropeptídios são liberados pelos terminais dos aferentes primários no corno dorsal da medula, onde exercem importante papel na modulação da transmissão nociceptiva. Entre tais substâncias destacam-se os aminoácidos excitatórios glutamato e aspartato e diversos outros neurotransmissores e neuropeptídios, incluindo as taquicininas [substância P (SP), neurocinina A (NKA) e neurocinina B (NKB)], peptídeo geneticamente relacionado com a calcitonina (Calcitonin Gene-Related Peptídeo-CGRP), colecistocinina (CCK), somatostatina, óxido nítrico (NO), prostaglandinas (PG), galanina, encefalinas e endorfinas (Figura 2) 3-6. Um dos mecanismos centrais de grande importância na fisiopatologia da dor é o da transmissão facilitada no corno dorsal e consequentemente para as vias nociceptivas mais altas. Mendell (1996) 7 demonstrou que os neurônios de Larga Faixa Dinâmica do corno dorsal da medula espinhal exibem uma potenciação dependente da frequência de suas respostas à repetida estimulação das fibras aferentes C, fenômeno referido como de facilitação central.
           Assim, a somação temporal lenta de estímulos induzidos por aferente nociceptivo C leva a uma sensibilização central dos neurônios nociceptivos do corno dorsal que se manifesta por uma redução do limiar de estimulação, com consequente elevação na frequência de descargas espontâneas destes neurônios no recrutamento de outros circuitos sinápticos com expansão de seu campo receptivo e em exagerada resposta a estímulos somatosensoriais, mecânicos e térmicos. A somação temporal de potenciais sinápticos lentos promove alteração nos sistemas de segundo mensageiro e fosforilação de receptores. Este mecanismo neuronal pode se manifestar no paciente como alodínia e hiperalgesia.
           Este fenômeno de facilitação central se deve à interação de dois mediadores liberados pelos terminais da fibra C na medula, principalmente o glutamato, que age nos receptores NMDA (NMetil-D-Aspartato) e a substância P que age nos receptores NK-1 de neurocinina. O bloqueio dos potenciais lentos na medula, seja através de antagonistas do receptor NMDA ou de antagonistas de neurocinina, previne o estabelecimento da sensibilização central.





Revista Brasileira de Anestesiologia 241
Vol. 48, Nº 3, Maio - Junho, 1998

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Receptores da dor e sua estimulação

          O primeiro passo na seqüência dos eventos que originam o fenômeno doloroso é a transformação dos estímulos agressivos em potenciais de ação que, das fibras nervosas periféricas, são transferidos para o sistema nervoso central.
Os receptores específicos para a dor estão localizados nas terminações de fibras nervosas Ad e C e, quando ativados, sofrem alterações na sua membrana, permitindo a deflagração de potenciais de ação.
As terminações nervosas das fibras nociceptivas Ad e C (nociceptores) são capazes de traduzir um estímulo agressivo de natureza térmica, química ou mecânica, em estímulo elétrico que será transmitido até o sistema nervoso central e interpretado no córtex cerebral como dor. As fibras Ad são mielinizadas e as fibras C não são mielinizadas e possuem a capacidade de transmitir estímulos dolorosos em diferentes velocidades. As fibras Ad, em função da presença da bainha de mielina, transmitem o estímulo doloroso de forma rápida, enquanto as fibras C são responsáveis pela transmissão lenta da dor. Ambas são classificadas em subtipos Ad1, Ad2, C1 e C2.
A transmissão dos estímulos nocivos através da medula espinhal não é um processo passivo. Os circuitos intramedulares têm a capacidade de alterar o estímulo e a conseqüente resposta dolorosa. A interação entre esses circuitos medulares determinará as mensagens que atingirão o córtex cerebral.
A sensibilização central implica alterações dos impulsos periféricos, com adaptações positivas ou negativas. Ocorre redução do limiar ou aumento da resposta aos impulsos aferentes, descargas persistentes após estímulos repetidos e ampliação dos campos receptivos de neurônios do corno dorsal.
Impulsos repetidos em fibras C amplificam sinais sensoriais em neurônios espinhais, enviando mensagens para o encéfalo. Lesões periféricas induzem plasticidade em estruturas supra-espinhais por meio de mecanismos que envolvem tipos específicos de receptores para o glutamato. Após a agressão tecidual há liberação de neurotransmissores, como substância P, somatotastina, peptídeo geneticamente relacionado com a calcitonina, neurocinina-A, glutamato e aspartato. Essas substâncias estão relacionadas com a ativação de potenciais pós-sinápticos excitatórios e dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA) e não-NMDA.Estímulos freqüentes dos aferentes geram a somação dos potenciais de ação e conseqüente despolarização pós-sinápticas cumulativa. Depois da ativação de receptores NMDA pelo glutamato há remoção do íon magnésio do interior do receptor e o influxo de cálcio para a célula, do que resulta a amplificação e o prolongamento da resposta ao impulso doloroso.
O aumento do cálcio tem como conseqüência a ativação da enzima óxido nítrico-sintetase e a estimulação da transcrição de protoncogenes. Estes são genes localizados no sistema nervoso central e estão envolvidos na formação de dinorfinas e encefalinas. As encefalinas têm ação antinociceptiva e estão envolvidas no processo de redução da neuroplasticidade e hiperalgesia. Entretanto, as dinorfinas têm um efeito complexo, já que possuem ação algogênica e antinociceptiva.

As fibras nociceptivas cruzam a linha média no nível do corno dorsal da medula espinhal e ascendem pelos tratos espinotalâmicos, espinorreticular, espinomesencefálico, coluna dorsal pós-sináptica e sistema espinopontoamigdaliano. Algumas dessas fibras terminam no núcleo talâmico ventroposteromedial (VPM) e depois ascendem para o córtex cerebral somestésico (S1 e S2), córtex insular e cingular anterior. Outros neurônios projetam axônios para o hipotálamo, formação reticular, substância cinzenta periaquedutal, núcleo medial e intratalâmico, e estruturas encefálicas anteriores que são responsáveis pelas respostas neuroendócrinas e emocionais a dor.
A ativação de fibras nociceptivas periféricas provoca migração retrógrada de fator de crescimento nervoso (NGF) para a medula espinhal e induz resposta segmentar reflexa, com transporte anterógrado de substância P para a periferia, ocasionando vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, atração de células do sistema imune para o local da lesão e degranulação de mastócitos com liberação de diversos neuromediadores. Desse modo, a substância P ajuda na manutenção e na expansão do processo inflamatório para o campo receptivo de fibras nervosas adjacentes à área lesada, constituindo a hiperalgesia secundária.
Por outro lado, as fibras adrenérgicas, além de contribuírem com o processo supracitado, aumentam a sensibilidade de fibras nociceptivas à ação de bradicinina. Potencializam esses efeitos, o vasoespasmo e o espasmo muscular, reflexos que proporcionam liberação de radicais ácidos e, conseqüentemente, a redução do limiar "para disparos" da fibra nociceptiva.

Referência: ROCHA, Anita Perpétua Carvalho et al. Dor: aspectos atuais da sensibilização periférica e central. Rev. Bras. Anestesiol. [online]. 2007, vol.57, n.1, pp. 94-105. ISSN 0034-7094.

Tipos de DOR

            A dor é uma experiência humana.
        A dor é definida pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP-International Association for the Study of Pain) da seguinte forma: “uma experiência sensória e emocional desagradável associada com uma potencial ou real ameaça ao organismo”.
Existem vários tipos de dor, várias classificações e subdivisões. A dor pode ser aguda ou crônica. Dor aguda é uma dor que ocorre logo após algo ter acontecido, como uma batida, um trauma, uma cirurgia, infecção, ferimentos, queimaduras, fraturas, inflamações, distensão ou estreitamento de  vísceras (estômago, intestino), ou alteração de função de um órgão, da circulação sangüínea, dor de dente.
A dor crônica é uma dor mais prolongada, ariunda de uma doença crônica, causa importante decréscimo na qualidade de vida do paciente. Existem vários tipos de dor crônica, dor de cabeça (cefaleias primárias), dor nas costas ou lombares (lombalgias), dor na nuca (cervicalgia), dor relacionada ao cancer, fibromialgia, dor miofascial, distrofia, dor fantasma, dor central, dores de coluna, dor articular (nas juntas), neuralgias.
A dor não pode ser medida por exame, é uma experiência vivida pela pessoa, porisso, é subjetiva e recebe interferência de aspectos emocionais, psicológicos, comportamentais, como a preocupação, ansiedade, depressão, assim como hábitos e vícios: cigarro, exercícios físicos, sobrecargas de trabalho.
A dor então constitui num sistema de defesa do organismo, num sinal de alerta do corpo para que haja um reequilíbrio antes perdido. É um aviso para que o indivíduo se retire de um ambiente inadequado, tóxico, potencialmente lesivo. Em última análise, para que haja uma adaptação do meio interno com o meio externo, do organismo com o meio ambiente. A dor de cabeça, assim como todas as demais dores, está inserida nesse contexto.